Que
pesquisador ou aluno que quer ser pesquisador não sonha em publicar na Science?
Eu tenho uma aposta pessoal comigo mesma que um dia ainda consigo meu nomezinho
seguido de Science (20xx), mesmo entendendo que pra isso tenho que mudar radicalmente meu
foco de pesquisa! Pra quem não sabe, a Science é o grande e influente jornal
científico mais prestigiado da academia. Então quando eu tô me sentindo desanimada
e desamparada no meio do dia improdutivo, vou procurar os papers recentes de journals
como Science e Nature pra me inspirar (ou me desestimular ainda mais...). Hoje
não foi diferente. Estou trabalhando numa revisão de um artigo meu, e essa
tarefa não é das mais interessantes ou animadoras – apesar de saber que o paper
foi aceito e que eu preciso mudar poucas coisas... – mas vc já tá cansada, fica
vendo todos os erros bobos e nem tão bobos assim que vc comete, dá uma
desanimada de pensar que vc nunca será capaz de publicar um dia na Science. Então
nada melhor que olhar exemplo de artigos bonitos e bem escritos que o seu nunca
será.
Como tá no
começo do mês tem sempre novidade! Alegria alegria! Sempre tem uns que pouco ou
nada me interessam, mas esse realmente me chamou a atenção: Lukas &Clutton-Brock 2013
Primeiro
porque comportamento me interessam. Acho que interessa a todos. A
gente sempre divaga sobre o comportamento dos animais e principalmente das
pessoas... E às vezes fica difícil saber
diferenciar: minha mãe jura que nossa gata traçava planos mirabolantes para
matar o nosso cachorro. Esses planos incluíam jogar deliberadamente uma pilha
no chão pra ver se ele pensava que era comida e morria intoxicado de lítio pela
sua gula. A Futrica devia ser muito má mesmo pra cometer esse tipo de
assassinato horrivelmente planejado. Mas não foi dessa vez e o Getúlio não
se deixou levar pela ânsia de comer tudo que caia no chão – até cebola, juro
gente! Mas isso não tem nada a ver com o artigo.
Enfim, eu
nunca estudei a fundo o assunto, mas pensava que a monogamia era uma resposta
clara ao aumento da necessidade de cuidado parental. Se a prole precisa de mais
tempo e maior dedicação dos pais, seria lógico pensar que as fêmeas
provavelmente escolheriam machos fiéis, que ajudassem na criação dos mesmos.
Assim, genes de “fidelidade” seriam selecionados desproporcionalmente, e a
população em geral seria monogâmica. Né não? Aparentemente não.
Segundo
esse estudo (publicado há 3 dias atrás!), a partir de uma análise com 2545 espécies
de mamíferos, os autores identificaram 61 transições de estado social - poligâmico
ou solitário pra monogâmico - e associaram as características específicas que
poderiam contribuir pra esse fenômeno. O cuidado parental não parece ser uma boa
justificativa porque em 41% de todas as espécies monogâmicas existem evidências
de que o macho não contribui de forma alguma com o cuidado.
O estudo
achou evidências de que a monogamia tenha surgido por causa da escassez e
intolerância de fêmeas como também, claro, competição por outros machos. Explico:
nos grupos ancestrais, as fêmeas eram solitárias e os machos tinham ampla
utilização do ambiente, se relacionando com diferentes fêmeas num espaço grande.
As únicas exceções parecem ser elefantes
e híraxes. A monogamia surgiu como uma resposta a fatores que levaram à
diminuição do tamanho populacional de fêmeas: a intolerância entre fêmeas; e a alimentação
de alta qualidade - que faz com que aumentasse a competição por comida. Os
machos então preferiam “guardar” a fêmea dele do que arriscar perdê-la pra
outro macho e não encontrar outra.
Um hírax, pra quem - como eu - também se sentiu idiota por não saber o que é um |
Um fato
interessante que suporta a hipótese de que com o aumento da qualidade de
alimentos pode levar a monogamia é que 91% dos primatas
monogâmicos se alimentam majoritariamente de frutas (alimento de melhor
qualidade) comparado a primatas poligâmicos, que comem folhas e cascas em sua
maioria. Daí o paper discute também que a mudança para monogamia nos humanos
pode ter sido causada por uma mudança dos padrões alimentares que reduziu a
população de fêmeas e limitou os machos saidinhos que queriam ficar variando de
fêmea (não necessariamente com essas palavras: “…the shift to monogamy in humans
may be instead the result of a change in dietary patterns that reduced female
density and limited the potential for males to guard more than one female.”)
Owl Monkeys (Macacos-corujas, eu acho), fiéis macaquinhos! |
Então agora a gente sabe, não tem nada disso de ajudar a fêmea, o negócio na natureza é só garantir uma fêmea mesmo. Meio triste isso, né? E o amor? hahahaha! Só uma
curiosidade do estudo – somente 9% de todas as espécies estudadas de mamíferos
são monogâmicas! Achei pouco, né?